| 20/ 01/ 2005 - AGÊNCIA ANDI 
 
 Enquanto aumenta o número de casos degestação entre adolescentes, faltam
 políticas públicas que estimulem
 permanência de jovens mães nas salas
 de aula
 Existe uma associação entre gravidez precoce, baixa escolaridade e baixa renda.
 As adolescentes grávidas estão concen-
 tradas nas famílias que ganham até um
 salário mínimo mensal. Muitas estão fora
 da escola antes de engravidarem e, se
 isso ocorre, as chances de seguirem o
 caminho da educação formal são
 cada vez mais reduzidas.
 Embora algumas vejam na gravidez
 uma possibilidade de melhorar de vida,
 na realidade há uma continuidade
 no ciclo de pobreza. São
 necessárias políticas públicas e
 também a participação da comuni-
 dade no apoio às jovens mães.
 O número de adolescentes e jovensbrasileiras grávidas é hoje 2% maior
 do que na última década; as meninas
 de 10 a 20 anos respondem por
 25% dos partos feitos no País,
 segundo o Ministério da Saúde.
 Esse quadro ajuda a engros-
 sar o índice de evasão escolar
 no Brasil, principalmente porque
 não existem programas que
 visem apoiar jovens grávidas
 e mães a seguirem nos estudos.
 Uma pesquisa do Departamento de Pediatria do Hospital Univer-
 sitário de Brasília, que durante
 quatro anos acompanhou 425
 grávidas de 13 a 19 anos do
 Distrito Federal e do Entorno,
 mostra que apenas 37,5%
 continuaram na escola durante
 a gravidez. Os motivos que
 levam 62,5% a deixarem de
 estudar são mal-estar, vergonha
 ou desestímulo. Os dados são de 2003.
 Gestação incômoda  Quando engravidam, muitas adoles-centes se sentem pressionadas a
 sair da escola porque são sub-
 metidas a constrangimentos dos
 diretores, professores, colegas
 e pais dos colegas. Alguns pais
 dessas meninas contribuem decisi-
 vamente para esse abandono ao
 preferirem esconder a situação
 “vexatória” da gravidez de sua
 filha, aponta a ONG Sempreviva
 Organização Feminista (SOF).
 No estudo do HUB, do total dejovens gestantes que pararam
 de estudar, menos de 40%
 retornaram à escola após o
 nascimento do bebê. Isso
 ocorre, de modo geral, porque
 elas não contam com serviços
 públicos, como creches, que
 poderiam cuidar dos seus filhos
 no horário das aulas. Além
 disso, assumem a responsa-
 bilidade dos afazeres domésticos.
 Outro fator, que atinge também
 os garotos, é trocar a escola
 pelo trabalho para poder sustentar
 a criança.
 De acordo com o Dossiê Ado-lescentes: Saúde Sexual, Saúde
 Reprodutiva, que levantou
 informações em Salvador,
 Rio de Janeiro e Porto Alegre,
 das moças que tiveram filho
 antes dos 20 anos, 25%
 pararam de estudar tempo-
 rariamente e 17,3% definitivamente.
 Mas 42,1% já se encontravam
 fora da escola quando engravidaram.
 Baixa renda agrava evasão escolar  Entre as adolescentes mais pobres– com renda familiar de um quarto
 do salário mínimo – são quase
 nulas as chances de concluírem
 o segundo grau após o nascimen-
 to de um filho. Em relação à
 escolaridade, o estudo do HUB
 mostrou que 65,5% dessas
 meninas tinham o ensino funda-
 mental incompleto, assim como
 48,5% dos pais das crianças.
 Em 1997, a ONG Semprevivajá tinha dados que relacionavam
 gravidez na adolescência e
 baixo índice de escolaridade.
 Conforme a entidade, entre as
 meninas que tiveram um filho
 antes dos 20 anos, apenas
 23% haviam estudado além da
 oitava série; esse número cresce
 para 44% quando se trata de
 adolescentes que nunca
 engravidaram. Ou seja, as
 meninas que se tornam mães
 terão menor qualificação e,
 portanto, menos chances
 de competir num mercado de
 trabalho cada vez mais
 exigente e com menos ofertas.
 A evasão escolar pode aumentar se a jovem tiver
 mais de uma gravidez.
 Mulheres que geram o
 primeiro filho mais cedo,
 geralmente, acabam tendo
 outros. De acordo com o
 Levantamento Mundial de
 Fertilidade realizado no final
 da década de 1980 pela
 Organização Mundial de
 Saúde, em 27 dos 29
 países abrangidos, mulheres
 que se casavam com 22 anos
 ou mais tinham, em média,
 0,5 filho a menos do que as
 que se casavam aos 18 ou 19
 anos. Quatro entre dez mães
 adolescentes têm o segundo
 filho antes de o primeiro fazer
 três anos (dados da SOF de 1997).
 Educação sexual  A educação sexual nas escolas, associada a programas de saúde, é
 uma medida eficaz de prevenção
 à gravidez precoce. Segundo o
 artigo Gravidez na Adolescência:
 dimensões do problema, da
 pesquisadora Maria Waldenez
 de Oliveira, especialista em Educação
 Comunitária da Universidade Federal
 de São Carlos, para que a
 educação possa efetivamente
 contribuir para a redução desse tipo
 de gravidez é preciso debater,
 dentro e fora das escolas, temas
 como sexismo, igualdade de gênero,
 diversidade étnica, romper o este-
 reótipo de mulher objeto, paternidade,
 violência sexual e mercado de
 trabalho para jovens pais.
 Na educação formal, ainda é preciso ampliar a discussão sobre a neces-
 sidade de a educação sexual integrar
 o currículo. A especialista
 alerta que, considerando a baixa
 taxa de escolaridade das mulheres
 no País, esses espaços de
 orientação podem ser encontrados
 na própria comunidade onde
 estão as adolescentes de nível
 socioeconômico e de escolaridade
 baixo. Maria Waldenez sugere
 que as próprias garotas podem
 se tornar promotoras de saúde
 em programas educativos
 voltados à modificação do
 quadro de gravidez nessa faixa etária.
 Baixa renda  Há forte correlação entre as taxas de gravidez juvenil e as baixas taxas
 de escolarização e de renda. Em 2001,
 entre as jovens de 11 a 19 anos que
 tiveram filhos, 81,2% estavam fora
 da escola e sua renda média familiar
 per capita era de meio salário mínimo.
 Já para as que não tiveram filho,
 a renda média era de 1,21 salário
 mínimo, conforme o Projeto
 Juventude, do Instituto Cidadania.
 Famílias que ganham até um
 salário mínimo per capita concen-
 tram 65% das adolescentes
 grávidas indica outra pesquisa,
 Juventudes e Sexualidade, da Unesco.
 "As meninas que estão na escola têmmelhor qualidade de vida, auto-estima
 elevada e um maior controle sobre
 sua vida sexual e reprodutiva,
 retardando a gravidez", afirma o
 especialista em segurança alimentar
 e integrante do Comitê Permanente
 de Nutrição da ONU, Flávio Valente.
 Ele explica que a mulher só está madura para dar à luz do ponto de
 vista biológico, em média três anos
 após a menarca (primeira menstruação),
 porque ainda está em crescimento.
 Como há uma tendência de menarca
 tardia entre as meninas desnutridas
 na infância e na adolescência, se elas
 engravidarem são maiores os riscos de
 prejuízo no desenvolvimento da mãe
 e do filho. “Uma melhor nutrição não
 reduz diretamente a gravidez precoce,
 mas protege tanto a mãe como
 o feto no caso de uma gestação
 na adolescência. Uma boa nutrição,
 associada a uma maior auto-estima,
 pode colaborar para a redução da
 gravidez precoce”, diz o especialista.
 Políticas de educação  O Ministério da Educação não tem nenhum programa específico
 para mães adolescentes, segundo
 informou sua assessoria de
 comunicação. Algumas ações
 do MEC têm recortes de gênero,
 mas não atendem as estudantes mães.
 Orientação sexual e questões de gênero fazem parte agora de um
 projeto piloto para formação
 de professores da rede pública.
 O projeto, que também inclui
 aspectos relacionados à raça/etnia,
 começa por cinco capitais do Brasil.
 A iniciativa é da Secretaria
 Especial de Políticas para as
 Mulheres (SPM), em parceria
 com o Ministério da Educação,
 Secretaria Especial de Promoção
 da Igualdade Racial e Conselho
 Britânico.
 A capacitação tem início na 1ª Oficina Internacional de
 Educação, Gênero e Raça,
 que será realizada de 30 de
 novembro a 1º de dezembro,
 em Brasília, com especialistas
 do Brasil e do Reino Unido.
 No evento, serão conhecidas
 também experiências bem
 sucedidas de escolas públicas
 de ambas as nações e de políticas
 
 de gênero, raça e inclusão no
 ensino, além de trabalhos de
 ONGs e de núcleos universitários.
 Desejo de ser mãe  Segundo o médico psiquiatra Jairo Bouer, muitas vezes a gravidez é
 desejada pelas meninas de baixa
 renda, por enxergarem aí a possi-
 bilidade de uma melhora de status.
 “As adolescentes que optam porengravidar visualizam a possibi-
 lidade de construir uma família,
 já que, em muitos casos,
 vêm de famílias que estavam
 destruídas por problemas sociais.
 Mas não é verdade. Os namo-
 rados nem sempre assumem a
 paternidade, a menina encontra
 dificuldades para estudar, traba-
 lhar e cuidar da criança.
 Isso faz com que o ciclo de pobre-
 za continue”, explica Bouer.
 Buscas de solução  Para Jairo Bouer, poderiam ser criadas algumas alternativas para
 estimular a permanência na
 escola de meninas grávidas e mães:
 -Flexibilização de faltas para as
 mães adolescentes;
 -Classe de recuperação ou aulas
 de apoio para as adolescentes
 grávidas;
 -Trabalho psicológico com as
 meninas grávidas e os colegas
 da sala de aula;
 -Apoio de um berçário perto,
 ou dentro, da escola.
 Prevenção no currículo  O Governo do Distrito Federal lançou em setembro o Projeto
 Saúde e Prevenção nas Esco-
 las Públicas do DF, que a
 princípio vai atingir 14 unidades
 de ensino. Uma delas é o
 Centro Educacional 6, de
 Taguatinga, que já desenvolve
 um programa de educação
 sexual com alunos e pais
 desde 2001. O diretor Edílson
 Rodrigues afirma que, com
 esse trabalho, houve uma
 queda no número de
 estudantes grávidas. Em
 2002, a escola teve 50
 casos de gravidez; em
 2004, apenas três.
 Adolescentes participativos  A ONG Reprolatina SoluçõesInovadoras em Saúde Sexual
 Reprodutiva, de Campinas
 (SP), trabalha pelos
 direitos sexuais e reprodutivos
 dos adolescentes. O objetivo
 é desenvolver no jovem
 autonomia para tomar decisões.
 Como ela faz isso?
 A presidente da ONG,
 Margarita Diaz, explica
 que a entidade tem duas
 linhas de ação: com
 prevenção e com apoio
 à adolescente grávida
 e ao garoto que será pai.
 A ONG mantém Centros de Capacitação para a
 aolescentes, educadores
 e agentes de saúde que
 atuam em escolas,
 comunidades e postos de
 saúde. As jovens mães
 participam de um programa
 de prevenção a uma nova
 gravidez indesejada.
 “Geralmente a garota grávida passa pelo
 serviço de saúde e não
 recebe informações de
 métodos contraceptivos,
 tendo uma segunda e
 até uma terceira gestação
 ainda nessa fase de
 adolescente”, enfatiza
 Margarita Diaz. Segundo
 ela, muitas vezes o inter-
 valo entre essas
 gestações é menor que
 dois anos, o que pode t
 razer prejuízos à saúde.
 Esses Centros de Capacitação 
 estão presentes em cidades  
do Acre, Amapá, Goiás, 
 Minas Gerais, Paraná e  
São Paulo. A ONG também  
atua na Bolívia e no Chile  
e mantém o portal Vivendo 
 a Adolescência 
 (http://www.adolescencia.org.br/ ),  
que é bastante procurado 
 nessa área, com mais de  
500 mil visitas desde sua  
criação e com respostas a  
mais de 8 mil perguntas  
sobre saúde e sexualidade.  |